Nessa semana gravei mais alguns episódios do meu podcast Inteligência Orgânica. Sempre quando abro o papo, digo que sou um pessimista com as redes sociais e o futuro do mundo intermediado pela inteligência artificial. O curioso é que, toda vez, enquanto falo penso no paradoxo que é produzir um conteúdo anti-redes digitais que depende justamente desse sistema para existir.
Essa ideia me lembrou o filme Matrix Reloaded (2003), em especial a cena em que Neo se encontra com o Arquiteto. Ali fica claro que até a rebeldia – a resistência – já estava prevista dentro do código. Zion, a cidade dos humanos livres, não é o fim do sistema, mas parte dele, uma válvula de escape necessária para manter tudo funcionando. É a ilusão de liberdade que assegura a permanência do controle.
O paralelo com as redes sociais é imediato: hashtags de protesto viram tendência, críticas ao algoritmo viralizam dentro do próprio algoritmo, até o ato de desligar o celular já foi transformado em conteúdo. O sistema aprendeu a incorporar a resistência como combustível. É como se cada vez que você acreditasse estar rompendo com a lógica das redes, na verdade estivesse apenas ocupando o lugar que o Arquiteto já havia reservado para você. E a Matrix, nesse caso, não é um software futurista: é o feed infinito, o vício em métricas, a crença de que engajamento é sinônimo de valor.
O caso recente do vídeo Adultização, publicado pelo influenciador Felca, é um exemplo claro de como até a denúncia mais contundente pode ser absorvida pelo próprio mecanismo que ataca. O choque inicial gerou mobilização, mas essa mobilização aconteceu exatamente dentro das mesmas plataformas que alimentam o problema. As redes sociais capitalizam a atenção — seja ela positiva ou negativa — e o algoritmo se realimenta até quando é exposto. O resultado é que a rebeldia vira parte do espetáculo, e o sistema, ao invés de ruir, se fortalece, provando que até a crítica mais dura já estava prevista na programação.
Fico pensando que talvez o caminho não seja a fuga completa — porque ela também já foi prevista — mas o ato de enxergar o código. Saber que toda vez que você posta, consome ou interage, há uma estrutura calculando sua permanência. Saber não para desistir, mas para redefinir a forma de usar.
Como Neo no final do primeiro filme, a liberdade não está em sair da Matrix, mas em perceber as regras invisíveis e decidir como moldá-las. No fundo, o jogo das redes talvez não seja escapar, mas acordar para o fato de que até a sua rebeldia já foi programada. E, ainda assim, insistir em buscar brechas de humanidade dentro desse código.
NO AR: INTELIGÊNCIA ORGÂNICAReflexões sobre tecnologia, pensamento crítico e o que nos torna humanos.
Essa semana, dois episódios fortes e necessários:
EP.34 – Escola do Futuro: Preparando Crianças e Jovens para um Mundo em Constante Mudança
O que a escola de hoje precisa ensinar para formar adultos capazes de enfrentar um futuro que ainda nem conhecemos?
Recebo Renata Aguilar — doutora em Educação, mestre em Psicologia e autora de mais de 15 livros — para uma conversa sobre como preparar crianças para profissões que ainda não existem, o papel da inteligência artificial na aprendizagem e os riscos de um ensino que adoece em vez de libertar.
Uma reflexão urgente para pais, professores e todos que acreditam que educação é a chave do futuro.
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EP.35 – O Problema Não é a IA, é a Ignorância Humana
Estamos vivendo uma guerra mundial fragmentada sem perceber?
Recebo Roberto Mohamed, advogado e comentarista político, para discutir como os conflitos globais estão redefinindo o poder mundial e afetando diretamente o Brasil. Falamos de Trump, China, Rússia, Índia, da implosão do PSDB, do papel de Alexandre de Moraes e da polarização que mata o diálogo.
Um episódio para entender o mundo além das manchetes.
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Até a próxima,
Pedro Cortella